Um pouco mais de azul

domingo, outubro 31, 2004

O post que não escrevi

Há pouco, estava triste por causa de uma discussão. Tinha começado um texto a desabafar sobre o assunto, pensando uma vez mais sobre se sou ou não uma boa mãe.
Alguém apareceu ao meu lado e leu o que estava escrito. Uma mão pequenina agarrou no rato, apagou o texto e escreveu no seu lugar: "Desculpa".
Claro que desculpo, filha. Claro que acredito que vais aprender a ser menos teimosa e a controlar esse mau génio. Claro que acredito que vais crescer como uma rapariguinha responsável, justa, digna de toda a minha confiança e orgulho. E eu estou aqui, ao teu lado, sempre, para te ajudar.

À espera

Há uma música neste CD do Rodrigo Leão (Ave Mundi Luminar) que me faz sentir frágil, ansiosa, como que à espera de algo. De novo o senti agora, e decidi ir ver como se chamava (nunca fixo os nomes das músicas). Título perfeito: À espera.

Mais um dia

Mais um domingo cinzento, outonal, passado a trabalhar. Mais um domingo na companhia da calma música de Rodrigo Leão. Mais um domingo em que me obrigo a sentar à secretária em lugar de passear, preguiçar, arrumar a casa, ver um filme. Parece um domingo igual a tantos outros. Mas, de algum modo, não é.

sábado, outubro 30, 2004

Bolinhos e bolinhós

Há um velho costume em Coimbra por altura dos Fiéis Defuntos. Depois do jantar, as crianças juntam-se, vestidas de escuro, com as caras pintalgadas de negro, transportando caixas de cartão ou abóboras vazias, decoradas com carantonhas, dentro das quais levam velas acesas. Tocam às portas da vizinhança, e cantam uma lúgubre cantilena, pedindo "bolinhos e bolinhós". As pessoas dão-lhes dinheiro ou guloseimas, que agradecem cantando uns versos apropriados; para quem nada dá, há também versos adequados.
Quando eu era pequena, nunca os meus pais me autorizaram a participar em tal brincadeira, vá-se lá saber porquê. Agora, a minha filha anda com as amigas pela rua fora, disfarçada de bruxa, com uma abóbora iluminada na mão. As influências americanas do Halloween associam-se a esta tradição que não sei datar, mas é bem antiga em Coimbra.
Deixo-vos a cantilena, tal como a escreveu a minha filha num trabalho para a escola:

Bolinhos e bolinhós

Para mim e para vós
Para dar aos finados
Que estão mortos enterrados.

À porta da bela cruz, truz, truz…

A senhora está lá dentro
Sentada num banquinho
Faz favor de vir à porta

P’ra nos dar um tostãozinho ou um bolinho.

Se derem canta-se:

Esta casa cheira a broa aqui mora gente boa.

Esta casa cheira a vinho aqui mora algum santinho.

Se não derem canta-se:

Esta casa cheira a alho aqui mora algum espantalho.

Esta casa cheira a pão aqui mora algum papão.

Propósitos

Levantei-me. Sentei-me ao computador, com vontade de dar cabo da fera. Há cerca de uma hora. Ainda não fiz nada, nadinha - é uma relutância imensa em pegar o touro pelos cornos. Mas não pode ser, tenho mesmo, mesmo, de trabalhar.
Acho que o meu blog anda a coisa mais chata à face da terra. Trabalho, trabalho, trabalho e mais dúvidas existenciais acerca do trabalho. O resto, cada vez mais o calo. Não me apetece falar sobre mim. Não me apetece mostrar-me. Talvez passe, quando acabar aquela coisa. A tal a que me vou lançar mal meta o frango no forno.

sexta-feira, outubro 29, 2004

Pequenas anotações

1) Quando quiserem que chova, é só chamar por mim. Atraio mais a chuva do que qualquer dança índia. Devia era ir vender este "talento" para o deserto.

2) Da próxima vez que tiver a brilhante ideia de me enfiar no hipermercado ao final de uma tarde de sexta, que alguém me dê um estalo (até posso ser eu própria). Bem o mereço, por tão desgraçada e idiota ideia.

3) Alguém sabe como fazer aumentar o colesterol "bom"(HDL) sem fazer subir a taxa do "mau" (LDL) ? É que por cá todo o colesterol "voa" baixinho, baixinho.

4) Estou mesmo desinspirada, não estou? Vou é fazer tese. Não que me apeteça (ao tempo que me desapetece...), mas tem de ser. E ter de ser é a tal coisa que tem muita força. Vamos a isto.

quinta-feira, outubro 28, 2004

Parabéns!

Ontem, a Rua da Judiaria comemorou o seu primeiro aniversário. É um dos meus blogs de referência, como já aqui o disse. Ali aprendo muito sobre temas de judaísmo, e mais ainda, encontro reflexões plenas de tolerância e bom senso relativamente ao conflito israelo-árabe. Muitos parabéns, Nuno!


Há dias assim

Para além da chuva, dias que nos parecem roubar todas as forças. Demoro horas a recompor-me - horas em que preciso de silêncio. Horas que deveriam ser só minhas, para calar, para conseguir aos poucos ouvir o som dos meus pensamentos. E depois, aos poucos, recuperar a capacidade de raciocinar, e usá-la. Precisava de pílulas milagrosas para fazer o trabalho intelectual render. Quem conhecer, avise.

Encharcada que nem um pinto

Assim cheguei eu a casa, há pouco. Absolutamente encharcada, até dentro da pasta e da carteira a água entrou.
Nesta minha santa terrinha, andaram a fazer mirabolantes obras nas rotundas da cidades, que agora se erguem, altíssimas, decoradas com uns blocos de pedra que devem ser tão artísticos e significar coisas tão profundas que ninguém percebeu o que lá estão a fazer. Mas ninguém se lembrou que o Outono estava à porta e as sarjetas tinham de ser limpas e alargadas. Chove a potes um dia, e as ruas viram um caos. Passam os carros, e mesmo com cuidado ensopam quem vai a pé - como eu.
Se escapar a uma valente constipação, é a Rainha Santa a velar pela saúde dos munícipes da sua cidade...

quarta-feira, outubro 27, 2004

E ao segundo dia fez-se luz

Ou seja, voltei a ver. Não encontrei nenhum D. Sebastião pelo caminho, mas o optometrista não é nada de deitar fora. Nem por isso, porém, fiquei com vontade de repetir a dose. Perdi a tarde toda com esta gaita, e não é um palminho de cara jeitoso espetado na minha frente a espreitar para dentro dos meus olhos que compensa o tempo perdido. Estou a entrar em stress só de pensar no que vai ser o meu dia de amanhã. Bolas...

Mais um dia

Pitosga, de visão desfocada. Anseio pelo final da tarde, quando puser as minhas bem amadas lentes de contacto e tudo em meu redor se tornar nítido de novo. Até lá, vivo numa espécie de névoa - será que ao menos aparecerá algum D. Sebastião ? E se não o vejo, por estar cegueta?

terça-feira, outubro 26, 2004

Resumo da jornada


Programa do dia

Entre hoje e amanhã, se os meus olhos conseguirem, vão os meus caros leitores poder seguir as desventuras de uma míope privada das suas lentes de contacto e com óculos mais do que desactualizados para poder ver em condições mais do que uns centímetros à frente do nariz. Vão assistir ao desespero de quem descobre que as lentes de contacto fazem falta para tudo, até para tomar banho (sim, costumo tomar banho com as lentes postas). Vão, em suma, apanhar ou uma seca, ou uma barrigada de riso - porque o meu sentido de humor costuma refinar em condições adversas. Resta saber quanto tempo consigo ir fazendo a vidinha normal cá por casa (nem me atrevo a pôr um pé na rua) antes de ter uma monumental dor de cabeça.

Para já, ainda não percebi o que me incomoda mais:
a) ausência total de óculos
b) uso de uns óculos foleiros, desactualizados há mais de 8 anos
c) uso de uns óculos todos giros, mas com correcção apenas do que faltava às lentes (ou seja, próprios para usar quando leio com as lentes, não sem elas).
Daqui por mais umas horas desconfio que já terei percebido.

Hoje estou assim

segunda-feira, outubro 25, 2004

Pequeno aviso à navegação

Só para dizer que hoje estou despistada, distraída e a modos que a flutuar entre um mundo e o outro. Ou seja, entre este em que troveja e ameaça chuva e a "brainstorm" que eu bem convoco para o meu cérebro, sem grandes efeitos até ao momento. E agora com licença, vou para o part-time do dia: motorista de freiras.

Flores



de Édouard Manet

Mahler

O Windows Media Player vai debitando as músicas que tenho no computador, e de repente... De repente, soam os acordes familiares de uma música dorida, feita de notas dilaceradas, ouvida tantas e tantas vezes seguidas que passou a ser parte de mim. Música em carne viva, repleta de memórias dolorosas, confusas, consoladoras. Noites e dias de irrealidade, de lágrimas e soluços, de promessas raivosas e convictas de dias melhores. Noites em branco, povoadas de fantasmas, de dolorosa solidão afogada em abraços a mim. Noite de outros abraços, noite estrelada, irreal, fugitiva, nas sombras de um Alentejo adormecido.
Adagietto da 5ª sinfonia de Mahler. Nesta música, tanto, tanto da minha vida. Percebo, neste instante, que essa dor já passou. Algures, sem dar por ela, virou-se definitivamente a página.

(E por um capricho informático a que sou totalmente alheia, segue-se REM, e dou comigo a dançar com "a man on the moon".)

Zás!

E a mosca chata, peganhenta, que há mais de uma hora zumbia em meu redor, invadindo o meu espaço e o meu campo de visão, quedou-se esborrachada sobre uma folha de papel.

Música

Passei para Bach. Concertos de Brandenburgo. Um belíssimo estimulante de neurónios, além de belíssima música. E Deus sabe, e Bach também, como os meus neurónios precisam de estímulo para trabalharem...

Noutra altura falarei acerca de viciantes músicas enviadas por mail, que já ouvi dúzias de vezes. O momento, agora, é barroco. Porque será que gosto tanto da música barroca, e tão pouco do correspondente estilo arquitectónico?

domingo, outubro 24, 2004

Pensamentos em torno de um bolo de chocolate

Pensamento nº 1 - Há, decididamente, uma parte de criança em mim que se mantém intacta: o gosto imenso por lamber a massa crua dos bolos.

Pensamento nº 2 - A maternidade faz maravilhas: deixo a maior parte da massa para a minha filha rapar. A generosidade é recompensada: ela ainda não é perfeita na arte de não deixar nem um bocadinho na taça; eu ensino-a em brilhante aula prática.

Para ti, meu amor querido

Para ti, a quem o meu trabalho obriga a mais um fim-de-semana em casa. Para ti, a quem dedico todo o tempo que posso, mas não todo o que desejava - o abraço mais apertado, mais terno e cheio de amor, o beijo mais doce, o maior agradecimento por conseguires compreender tão bem como o trabalho, neste momento, condiciona a minha disponibilidade. Para ti, a promessa solene de que, dentro em breve, as coisas mudarão. Porque por ti, razão última de quanto faço, ganho novas forças e convoco toda a inspiração do mundo. Para que, logo à noite, esteja bem perto do fim este capítulo.

sábado, outubro 23, 2004

Um problema

Como trabalhar agora, depois de tal jantar?

Menu

Não há sapateira, mas camarão pescado no fecundo mar de Moçambique, acompanhado por uma salada ligeira e maionese. Não há Alvarinho nem Ruinart, mas um certo vinho leve da Estremadura, descoberto numas férias há anos, que só depois soube várias vezes premiado, percebi bem porquê. Para sobremesa, salada de fruta, com bagos de romã, como gosto de fazer nesta altura do ano. Servidos?

Um desejo

Este não é sonho, é gula. Apetece-me comer sapateira. Deliciar-me com tostas estaladiças, barradas com sapateira. Acompanhadas com alvarinho. Ou com aquele magnífico champagne francês que...
Os desejos multiplicam-se. É melhor calar-me.

Um sonho

Esta tarde dei comigo a sonhar com o que eu queria que fosse a minha vida, daqui a um ano. Escrevi-o. Não sou capaz de o colocar aqui. Fica guardado, num cantinho - tipo carta ao menino Jesus, a quem sempre preferi escrever, em lugar do Pai Natal. Está lá tudo o que é essencial para ser verdadeira, intrinsecamente feliz.
Quem me dera acreditar, como já nem a minha filha acredita, que basta sermos muito bem comportados para que o menino Jesus aceda aos pedidos que lhe fazemos...

sexta-feira, outubro 22, 2004

Enjoo - e força

Estou num daqueles dias de enjoo, enjoo total de tudo. O pouco que me falta para terminar este derradeiro capítulo não serve de incentivo. Não quero passar mais tempo com isto. Quero é ir ensinar a
filhota constipadíssima, que faltou às aulas hoje e está farta de estar em casa, a fazer crochet. Ou ir apanhar sol nas trombas, que tão bem sabe depois de uns dias feios. Ou não fazer a ponta de um corno, aproveitando esta tarde livre.
Mas, caramba, estou aqui. Frente ao computador, numa espécie de braço de ferro, olhando para o texto do Word que parece estar a rir, escarninho, para mim, como se me desafiasse num "não me apanhas, não me apanhas" infantil, que mais apropriadamente seria, no caso "não me acabas, não me acabas". Juro: apanho-te. Acabo-te. Esfolo-te. Dou cabo de ti e termino isto. Neste braço de ferro, sou eu quem venço. Com taquicardia ou sem ela, com vontade ou sem ela, eu venço. Podes crer. Vais ver. E não vai demorar muito. E depois, chamarás por mim: "senta-te aqui, vem para o pé de mim". E eu vou gozar o sol lá fora, e fazer crescer riscas coloridas de lã com crochet e tricot, a meias com a minha filhota.

Mas que dia é hoje, afinal?

Será que é 1º Abril? Ou que o dia das mentiras, das petas, dos disparates publicados na imprensa para enganar os leitores passou para 22 de Outubro? Que mais pode pensar quem lê uma notícia destas?

quinta-feira, outubro 21, 2004

Blogs que vão passar a constar da lista ao lado

quando eu tiver pachorra para mexer no template. Alguns já os conheço há algum tempo, e só não estão ali por esquecimento e distracção. Outros foram descobertas recentes que muito agradavelmente me surpreenderam.
Sem nenhuma ordem especial, ficam aqui indicados
A minha luz (mais um terno blog de mãe para filha);
As ruínas circulares (onde mora um coelho suicida);
Ene problemas (já são mais de 250);
Drowned world /Substitute for love (escrito por quem persegue a vida);
Anamnese (onde encontrei a deliciosa piada sobre os burros e as cabalas que ontem citei);
Adufe (há séculos que o leio, é dos tais links que mentalmente está feito há imenso tempo);
La marée haute (blog com cheiro a amizade e maresia).

E já agora, duas informações mais.
Uma, que o Jorge Mourinha fez o favor de criar um blog sobre cinema: A Casa Encantada. Cada vez mais tenho vontade de comprar um leitor de DVDs e passar serões cinéfilos diante da TV...
Outra, que em torno da Alternativa se estão a juntar numerosos insatisfeitos com a situação política nacional, que reivindicam uma alternativa real ao bloco central.

Amor de mãe é

Pôr Mozart de lado e tratar de sacar músicas da Britney Spears da net. E, pior ainda, ouvi-las com a minha filha.

Música

Companhia musical de ontem e hoje: as sonatas para piano de Mozart tocadas por Maria João Pires. Sublimes.

Onde se fala de estudantes, balbúrdias e o que eu acho sobre tudo isso

Os estudantes de Coimbra andam de novo a ser motivo de notícia. Não só porque estamos naquela que agora se chama Festa das Latas, e que veio fazer dilatar a velha tradição da Latada da recepção ao caloiro, conseguindo-se espectáculos, convívios e mais umas quantas coisas que criam uma espécie de Queima das Fitas de início do ano lectivo, mas porque a estudantada está em pé de guerra com o governo, o reitor, a universidade e os professores em geral.
Lembram-se por certo que, no decurso do ano lectivo passado, depois de sucessivos boicotes à votação do valor das propinas pelos estudantes que fazem parte do Senado, esse valor acabou por ser fixado quando, ausentes embora os discentes, havia quorum para proceder à votação. Agora vem a vingança. E eis que um bando de meninos (a quem auguro uma fulgurante carreira partidária mal saiam da universidade com o canudo debaixo do braço) resolve interromper a abertura solene das aulas irrompendo pela sala adentro, à revelia do decidido em Assembleia Magna; e eis que decidem cortar a principal rua de acesso à Alta da cidade; e eis que ontem resolveram querer invadir o Senado e boicotar a reunião deste órgão (em que têm assento, relembro), estando muito indignados porque havia segurança policial a impedi-los de realizar os seus propósitos.
E que penso eu de tudo isto? Algumas coisas, e ao mesmo tempo nada. Penso que os estudantes de Coimbra chegam à cidade e convencem-se de que aqui são reis - como eram noutros tempos, há muitas décadas atrás. Acham que podem fazer o que muito bem entenderem, apenas porque são estudantes e reivindicam o que acham ser os seus direitos. Que me sucederia a mim se resolvesse, em nome de uma causa que achasse justa, fechar uma estrada que não me pertence? Pois, lá vinha a polícia tentar resolver o caso e, caso eu resistisse, ia parar à prisão com toda a pinta, não era? Em que é que os estudantes são mais do que eu? O mesmo raciocínio é válido relativamente aos outros acontecimentos referidos.
Se condeno, por outro lado devo dizer que gosto. Gosto desta balbúrdia. Se não se sonha com fazer um Maio de 68 aos 18, 20 anos, quando é que se vai sonhar? Há uma costela assim a modos que pró-revolucionária ou anarca na minha pacata pessoa. Mas essa costela não gosta de falta de educação nem que, lutando pelos nossos direitos, se atropelem os direitos dos outros. Será isto uma contradição? Provavelmente, não estou muito preocupada com isto.
Também gosto destas convulsões estudantis por saber que elas revelam um profundo mal-estar nas universidades. E estas bem precisam de estudantes que não sejam simples cordeirinhos mansos que seguem o rebanho em fila obediente. O pior é que me parece que, não querendo seguir o rebanho, eles também não sabem lá muito bem por onde vão ou querem ir, nem como lá chegar. Não é assim, creio, que os estudantes conseguirão o ensino de qualidade que reclamam, e que têm todo o direito de exigir; se esse ensino deve ser ou não gratuito, ou se deve, isso sim, existir um eficaz serviço de bolsas e uma verdadeira acção social escolar, não sei bem, tenho mais dúvidas do que certezas a tal respeito. Mas isso já me levaria para outras reflexões que não me apetece tecer agora. Fico-me por aqui.

Adenda - Só agora vi as imagens dos confrontos de ontem. Não sei bem porquê, lembrei-me dos barquitos de guerra a manter à distância a traineira do aborto. Gás lacrimogéneo para dispersar 200 estudantes? Polícia de choque? Que é isto? Acho que está é tudo a ficar doido. Alunos, professores e polícia. E mais o país inteiro.

quarta-feira, outubro 20, 2004

Irresistível

Mais pérolas

Decididamente, hoje é dia de non sense, de disparate total, a nível privado (basta ler o que andei a escrevinhar nos comentários a um post ali em baixo) e público (vide post imediatamente anterior). Descobri que o sr. ministro dos Assuntos Parlamentares disse que "as cabalas existem independentemente da vontade subjectiva de as constituir". Cuidado, elas andam por aí... Hoje vou procurar uma cabala debaixo da cama quando me for deitar.

De novo

Ouço ou leio notícias e a sensação regressa: vivemos num país que não existe, numa espécie de anedota permanente. No outro dia, foi o fantástico esclarecimento sobre a sesta do primeiro-ministro. Hoje, a tirada deste impagável brincalhão é esta: que os professores colocados com horário zero nas escolas vão assessorar os juízes.
E que tal se os ministros incompetentes passassem, por exemplo, a limpar as casas de banho dos ministérios em lugar de brincarem aos governantes?

Podem ler sobre o assunto aqui e aqui, por exemplo. Em ambos os posts deixei um comentário. A cada vez que penso no assunto, nova ideia me ocorre no sentido de ajudar à «gestão integrada de recursos humanos da administração». E cresce a vontade de ir daqui para fora, mesmo. Recuperemos o plano das Grenadines!

Ai...

Momento telefónico que me tirará uns anos de purgatório - ou me fará ganhar mais uns, dados os meus maus, péssimos pensamentos.

Adenda - Mais uns anos de purgatório, sem dúvida. E a certeza de que volto a fugir a sete pés de reuniões alargadas de família. Se volto!

terça-feira, outubro 19, 2004

Só para que conste

Hoje estou bem disposta. O pateta do coração continua a andar acelerado, mas como já sei que não está avariado, apenas a sofrer os efeitos secundários da recta final da tese, decidi não me preocupar mais com ele (e tomar as pílulas que o médico mandou, claro). Com o fim das preocupações e o alívio de me ver liberta de trabalho a duplicar durante uns dias, estou bem disposta. Que bom!

Pôr-do-sol

Olho pela janela. Entre o vento que assobia e um aguaceiro, eis que surge, de repente, um magnífico pôr-do-sol. O céu ficou cor-de-rosa e azul, em camadas de nuvens despenteadas por entre as quais despontam os raios do sol poente. Lindo.
Enquanto escrevia, dissolveu-se o sol, desapareceram as cores. Ficaram só restos de rosa e azul no cinzento das nuvens.

A minha verdadeira vocação

Vou arranjar estores e persianas. Vale a pena. Mudaram uma fita e um fio, desencravaram uma persiana saída da calha. Foram ao outro lado da cidade e voltaram. Em cerca de uma hora, ganharam 45 euros. E eu para aqui, a queimar neurónios com teses de doutoramento...

segunda-feira, outubro 18, 2004

Ao serão

Este é o primeiro serão com ar de Inverno deste ano. O vento assobia lá fora e faz sentir mais aconchegante a casa. Pela primeira vez, tive o cuidado de correr persianas e cortinados, tirei do armário pijamas de Inverno. A minha filha quis dormir com meias calçadas, eu estou de manta quentinha sobre as pernas. Apetecem castanhas assadas e o conforto da lareira. E tricotar enquanto vejo um filme interessante na TV ou ouço música. Assim vou sonhando serões tranquilos para este Inverno que se avizinha. Os antigos louvavam a "aurea mediocritas" - e eles sabiam umas quantas coisas acertadas. Como essa de a felicidade, a paz, a harmonia se encontrarem em coisas simples.

Pensamentos em tons de Outono

O que me faz preocupar, o que me leva a dar atenção ao que o meu coração palpitante-sem-estar-apaixonado me está a querer dizer é essencialmente isto: na minha falta, quem me substituiria junto da minha filha? É terrível saber que com o pai ela não estaria tão bem como comigo; e não por uma questão de ligação especial de mãe-filha, ou de ter a mania de que só eu é que sei.
E estando eu doente, quem cuida de mim? Ninguém. Chegados a este ponto das minhas divagações, indignam-se decerto os meus muito queridos amigos, que tão carinhosos e atentos têm sido. Mas a verdade é que a sua vida não sou eu...
Ou seja: tenho de tomar cuidado comigo, mesmo. Ponto final.

domingo, outubro 17, 2004

Descansa em paz

Esta manhã, a minha filha chegou ao pé de mim desolada: uma bonequinha de porcelana de que gosta muito tinha uma perna partida. Bem tentei, com várias pinças, chegar ao elástico que permanecia dentro do corpo da boneca e ao qual estava agarrada parte da perna aleijada - sem sucesso. Como sempre quando tais coisas acontecem neste tipo de bonecas, o resultado acabou por ser a queda da outra perna e a cabeça a soltar-se. A boneca está mesmo estragada.
Lágrimas copiosas, redondinhas rolaram pela carita da Miosótis quando pegou nas várias partes e as levou. Apareceu-me daí a pouco com a boneca muito bem acondicionada numa caixinha de cartão. Isto de ter lido "Os Desastres de Sofia", velhinho livro da Condessa de Ségur, e de ter avidamente devorado os desenhos animados nele baseados que há tempos deram na televisão tem destes resultados: queria fazer o funeral da boneca. A ideia, porém, de enterrar os "restos mortais" da Sofia (assim se chamava a "falecida") num buraco do quintal dos avós não agradava muito. Sugeri, então, que se limitasse a guardar a caixinha num dos armários de parede onde se guardam as coisas que não estão a uso. Assim, daqui por uns tempos, podia encontrá-la e recordar a sua bonequinha.
A Sofia jaz agora na mesma caixa de cartão colorido, dentro do antigo cesto das fraldas da Miosótis, coberta pela capa do vestido de princesa de um Carnaval passado. Por cima, está um quadrinho redondo com o Menino Jesus, oferta pirosa de uma tia, e um papelinho a dizer "Descansa em paz, Sofia".

Para mais tarde recordar

Na noite passada, reinava o entusiasmo. Esta mãe maluca consentira que a filha dormisse numa espécie de tenda montada no quarto dela com o que sobreviveu de uma casinha de pano que durante vários anos foi palco de muitas brincadeiras. Apesar de achar que era um disparate, porque nada confortável, arranjei-lhe um colchão de almofadas, o cobertor pedido. Quando, antes de me deitar, a fui espreitar, dei com ela a dormir a sono solto... na cama. Não há como aprender à própria custa.

E cá se vai andando

Nuvens grossas, cinzentas invadiam hoje o céu. É tempo em que apetece uma manta sobre os joelhos enquanto se trabalha, e chá quentinho. Não apetece, em contrapartida, trabalhar. Não há nada pior do que parar para depois custar imenso retomar o fio da meada. E esta meada deixou de ter piada, passou a ser frete. Ora eu detesto, mas detesto mesmo trabalhar por frete, e custa-me que algo que sempre me entusiasmou nisso se torne.
Só mesmo me dá alento o saber que falta pouco, tão pouco... O pior é que o velho ditado que diz que o que custa mais a esfolar é o rabo revela-se por demais verdadeiro.

sábado, outubro 16, 2004

Boletim de saúde

Parece que ainda não é desta que o corpo vai entrar em greve. Prometi tratá-lo com todo o carinho mal acabe aquela porcaria-daquela-coisa-que-nem-sequer-quero-nomear, e que hoje, em lugar de noitada de trabalho, ia para a cama a horas decentes, na companhia de um hilariante livrinho do Garfield. A ideia deve ter agradado: o meu coração aquietou-se (a ida ao médico provavelmente surtiu também algum efeito). Ainda bem. Não gosto de sentir que o tenho, nem de dar com ele a palpitar por razões não românticas.
Como promessa é dívida e não quero retaliações de órgãos vitais zangados, recolho-me a vale de lençóis. Boa noite!

sexta-feira, outubro 15, 2004

O corpo é que paga

"Quando a cabeça não tem juízo... o corpo é que paga" - assim cantava o António Variações. Pois, é claro que o corpo é que paga, e depois reclama, quando exigimos dele em demasia ou fazemos ouvidos moucos ao que ele vai pedindo. A seguir passa a manifestações impossíveis de ignorar, ou pelo menos que o bom senso aconselha a não ignorar. Espero que não chegue a entrar em greve.

quinta-feira, outubro 14, 2004

Gosto disto



Van Gogh, Noite estrelada

Na total falta de inspiração para escrever, que as imagens falem sozinhas.

quarta-feira, outubro 13, 2004

Escrevinhando

Uma série de temas baila na minha mente, sugerindo-me posts. E depois nada sai. A culpa não é apenas do eco que, hoje, qualquer pensamento ligeiramente elaborado provoca na minha caixa craniana - fruto da estúpida constipação que resolveu atacar-me. A culpa também não é toda do imenso trabalho que, naturalmente, me esperava ao regressar. Acho que, em parte pelo menos, o que sucede é que todos os temas que me ocorrem irritam-me, incomodam-me - e o silêncio é uma forma de o evitar.
De política, por exemplo, mais vale não falar. Se até alguém como o Venerável Grão Mestre Queijeiro desabafa assim a altas horas da noite, nem quero pensar como ficaria eu, simples mortal, caso dedicasse grande atenção às desventuras desgovernativas deste nosso Portugal.
Acerca dos repelentes espectáculos que a nossa televisão serve, qual versão hodierna de outros ópios para outros povos, não me apetece, mesmo, escrever. Hoje, enquanto esperava a minha vez no dentista, folheei uma daquelas revistas meio cor-de-rosa, meio informadora de programas da TV, que dedicava páginas e páginas ao novo programa da TVI. Fico parva como se torna normal, ou mesmo digno de louvor, um programa imbecil como a tal Quinta onde se juntam umas celebridadezecas à medida de um Portugal medíocre, pequenino, parolo, mesquinho. Abjecto deve ser o adjectivo melhor para caracterizar tais programas. Um dia, sem dor de cabeça e com tempo, explicarei melhor porque é que me recuso a ver, nem mesmo por piada, semelhantes "reality-shows". E depois falam do ópio do povo... A este propósito, e de outros acontecimentos, escreveu Augusto Santos Silva um lúcido artigo no Público.
Vem a talhe de foice outro tema que me faz pensar, e sobre o qual me apeteceu já escrever também: todos os dias, ouço na rádio publicidade a revistas com conteúdos incríveis. Ele é poções de felicidade, ele é orações mágicas, ele é predições de futuro, ele é um mar de parvoeiras que exploram a infelicidade, a falta de perspectivas de um povo que assim se aliena, embarcando em crendices e projectando-se nas vivências de outros, ora invejando os "famosos", ora sentindo aquela malvadazita alegria de os ver sofrer como ele próprio. Só assim se explica o sucesso de tanto, mas tanto lixo em forma de revista... Só assim se explica o ávido consumo das notícias bombásticas, dos escândalos.
Com estas reflexões acerca daquilo sobre que não me apetece falar acabei por escrever imenso. Nem fica espaço para um bem merecido puxão de orelhas ao jornalista da Sábado que escreveu um textozinho sobre a História de Portugal que a revista está a reeditar, nas páginas 34-35 do seu último número. Ele não a leu, obviamente, e por isso diz asneira da grossa quando tenta explicar quem eram os moçárabes (no canto inferior direito, numa espécie de dicionário da conquista islâmica): nunca eles deixaram de ser cristãos, mesmo sob o domínio muçulmano! Outras calinadazitas, menos graves, surgem pelo meio do texto, mas o melhor mesmo é o primeiro parágrafo. "Portugal nasceu a seguir a uma escaramuça, com Afonso Henriques de um lado e a mãe, D. Teresa, do outro". Brilhante resumo, não haja dúvida. Se é isto o que se aprende de História de Portugal nas nossas escolas, estamos mesmo mal.

Anúncio

Constipação, oferece-se. Com todos os sintomas habituais: cabeça pesada, nariz ora fungão, ora tapado, arrepios pelo corpo todo, garganta ligeiramente a arranhar, espirros e tosse de vez em quando.

terça-feira, outubro 12, 2004

E ainda Roma

Em nenhuma outra cidade se ganha aversão à Igreja institucionalizada como no centro do catolicismo. Sinto Cristo mais próximo nas perturbadoras ruínas do Coliseu do que na basílica de S. Pedro.

Mais Roma



Um lugar muito especial: o Pantheon. Atrai-me, nem sei bem porquê. Alguns dos melhores momentos destes dias em Roma foram passados nesta praça.

domingo, outubro 10, 2004

Vacanze romane


Razões pelas quais me apetece apanhar o primeiro avião para longe daqui (1)

É claro que o sentimento de bem-estar a que ontem aludia não podia durar muito. Bastou acordar em sobressalto um pouco antes das 7 da matina, com a música em altos berros dos estudantes que moram no apartamento do lado. Abri a porta da rua, verifiquei que o barulho vinha efectivamente dali, toquei à campainha. Imediatamente a música parou. Seguiu-se um diálogo que me enfureceu: o menino que me abriu a porta disse-me para estar calma e que respeitava a minha reclamação, por isso parava a música, apesar de ter o direito de fazer o barulho que lhe apetecesse. Ou seja, a excelência fazia-me o favor de não me fazer barulho. Não é assim. Falta-me a legislação exacta sobre o assunto, que vou encontrar e entregar ao meu vizinho, juntamente com uma cartinha bem clara acerca do que sucederá se este tipo de comportamento se repetir (já não é a primeira vez que me levanto a meio da noite para ir mandar calar os rapazinhos). Mas na verdade, muito mais importante do que o que diz a lei, e o facto de que a simples boa-educação, cordialidade, respeito pelo próximo deviam levar à preocupação de não incomodar os vizinhos a qualquer hora que seja, ainda para mais cedíssimo e ao fim-de-semana. Não devia ser preciso que alguém batesse à porta de um jovem adulto para lhe chamar a atenção para o facto de não dever ter música em altos berros às 7 da manhã, nem de não dever falar aos berros a essas horas. Isto aprende-se, ou devia aprender-se, em casa, com a educação dada pelos papás. São regras de convivência básicas.

Encontrei ao chegar alguns escritos sobre um certo "código" a seguir numa escola de Colares, creio. Se calhar sou bota de elástico, mas não acho que a criação de tais códigos seja um simples disparate, num tempo em que tanta da nossa juventude parece desconhecer não apenas as básicas regras de gramática como as da vivência em sociedade - como de manhã bem cedo tive a oportunidade de, uma vez mais, comprovar. Chamem-me, repito, bota de elástico, mas eu não vou trabalhar vestida com a roupa que levo para a praia, nem falo com os meus colegas da mesma forma que falo com os meus superiores hierárquicos, etc, etc, etc. Há as tais regras de convivência, de respeito, etc, etc, que dantes se aprendiam em casa, e agora pelos vistos não se aprendem. E se tais matérias não se aprendem em casa, se calhar deviam aprender-se na escola, não é?
Não, não tenho nada contra o uso de mini-saias, nem de t-shirts que deixam o umbigo à mostra, nem de chinelos, nem de calções usados por homens (as minhas reticências em relação a tudo isso são, essencialmente, de ordem estética). Mas, caramba, entre ir-se para uma prova oral de fato e gravata ou de calções, t-shirt velha e chinelos de praia, ou entre a forma de vestir das seguidoras de monsenhor Escrivà e roupinha que deixa as meninas quase despidas vai uma grande, imensa distância. Um pouco de bom senso não faz mal a ninguém, muito pelo contrário.

Esclarecendo umas coisitas

Claro que sentir-me muito bem é em boa parte fruto do facto de, durante estes dias, terem sido raras as notícias deste rectângulozito de terra em que nasci, para lá das de carácter meramente pessoal. Porque começo a ler jornais, os blogs do costume, a ouvir o que me contam e fico inquieta. A primeira reacção é agarrar na minha filha, comprar um bilhete de avião só de ida e desaparecer daqui para fora (até tenho uma ideiazita sobre um negócio chorudo, chorudíssimo, lá na bela terra onde andei e onde ficou um pedacito do meu coração, como nunca aconteceu com qualquer outra cidade onde tenha estado até hoje - mas isso é outra história). Outra reacção instintiva é rir, rir, rir e achar que isto é apenas um sonho tão parvo como os que resolveram povoar algumas destas noites passadas longe. Outra ainda é parafrasear o Obélix e dizer, com convicção, que os portugueses são loucos. Tendo também a acreditar que Portugal, simplesmente, não existe; não pode ser real um país assim.
Mas é. Ainda li e ouvi muito pouco para perceber bem que dose de loucura colectiva anda a dar pelo país. Mas que anda, anda. Pelo meio de toda essa loucura, parece que mais um anestésico colectivo teve início numa inenarrável estação televisiva cá da terra. Pão e circo à moda de 2004, pois claro. Avidamente engolidos e digeridos.
Fica aqui desde já um outro esclarecimento: neste blog nunca se falará do que sucede em tal programa idiota. Pode haver quem ache que é um óptimo anti-depressivo, que há uns pobres diabos que não valem a ponta de um corno mas fazem rir um país deprimido e acinzentado, o que quiserem, até que sociologicamente vale a pena ver tal coisa (lembro-me deste argumento usado por quem se pelava por telenovelas mas não o queria admitir). Eu não acho nada disso. Sou assumidamente fundamentalista nesta matéria. Quando forem horas mais decentes e a minha cabeça conseguir produzir pensamentos mais elaborados, explico-vos porque é que me repugnam e dão vómitos programas como o Big Brother, Quinta das Celebridades e quejandos. Agora, antes de ir dormir, quero continuar a sentir-me bem.
E para tal, penso várias coisas - e porque são coisas boas, fico aqui a pensar nelas, em lugar de ir dormir; mas é bom saborear lentamente o que nos diz muito. O que penso? Que em nenhum momento me sinto feliz como quando abraço a minha filha; que a amizade sincera, desinteressada é um dos sentimentos mais bonitos e gratificantes à face da terra; que trabalhar com rigor e dedicação e ver o nosso esforço reconhecido nos faz sentir belamente realizados; que me apaixonei por Roma.
E agora vou mesmo dormir. Ao lado da minha menina, que hoje pediu para dormir comigo. Vou fazer-lhe uma festa, dar-lhe um beijo sem a acordar, e agradecer a Deus - porque também em mim Ele fez muitas maravilhas.

Back in business

Ora cá estou de volta. Completamente estourada, que isto de turismo científico cansa qualquer um (quanto mais uma cansada profissional). É que é trabalho, é conversa séria e estabelecimento de contactos da maior importância, mas é também conversa a brincar que cria e reforça laços de amizade, é deitar a desoras e ter de acordar cedíssimo, mas não perder a oportunidade de rir até à barriga doer com as histórias e anedotas contadas, nem de aproveitar todos os bocadinhos para conhecer melhor um país belíssimo e respirar a sua atmosfera única.
E depois vem a chatice de enfiar na mala o dobro do que se levou, esperar o avião que está atrasado, enfiar no dito e esperar pela hora de lá sair, no entretanto comer a porcaria de sanduíche de entulhar qualquer estômago que a nossa TAP gentilmente oferece ao comum dos mortais que não viaja em classe executiva nem faz viagens intercontinentais, tentar encontrar uma posição confortável para as pernas, amaldiçoar o vizinho da frente que encosta a cadeira todo para trás e ainda nos deixa com menos espaço para nos mexermos, ter vontade de lhe espetar com os pés nas costas, para ver se ele se toca e volta a pôr as costas na posição normal (ainda por cima o gajo vai em executiva, e come e bebe à tripa-forra, e eu pr'ali com a bodega da sanduíche a pesar como cimento cá dentro...).
Se viajar é óptimo, voltar a casa também o é. E agora, ouvindo música calma, com a minha filha ali mesmo ao lado, dormindo tranquila depois de mil abraços e beijos dados ao vivo, não enviados por telefone, de regresso ao meu mundo mas ainda cheia de todas as vivências dos últimos dias (que não parecem pouco mais de uma semana, mas um mês inteiro), sinto-me bem. Muito bem, mesmo.


 
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