Um pouco mais de azul

terça-feira, abril 19, 2005

Fantasmas

À medida que a vida avança, verifico que vivemos rodeados de fantasmas. Muitos. Os do passado. Os do futuro. Os que causam ansiedade aqui e agora e nos deixam expectantes, tensos...
Aparecem sem darmos por eles. Ao voltarmos a certos lugares. Ao pegarmos em certas roupas. Ao ouvirmos certas palavras ou músicas. Ao sentirmos certos cheiros. Ao (re)vivermos certas situações.
Alguns fantasmas são doces e meigos. Como que vêm do fundo da nossa memória encher-nos o peito de cheiros e vozes que já não se sentem nem ouvem, fazendo-nos bem ao coração.
Outros, porém, são negros. Têm cheiros, também - cheiros a doenças, a hospital, cheiros que nos fazem querer fugir, fugir para bem longe, para onde eles não cheguem nem tragam recordações dolorosas.
Também há fantasmas de passados felizes nos quais custa pensar. Há lugares onde não se devia voltar, porque neles se foi feliz. Deviam ficar selados como eram então, não se modificando nunca na nossa memória a aura especial que para nós têm.
Há ainda fantasmas que não correspondem a nada de material, mas a medos, a dores, a cicatrizes, que, tal como o reumatismo em tempo húmido, se fazem sentir de repente, mostrando-nos que estão lá, que as marcas permanecem. Condicionando a nossa forma de sentir, de agir. Tolhendo-nos, quantas vezes, os movimentos. Deixando-nos expectantes, ansiosos. Com frio por dentro. Frágeis, vulneráveis.
Hoje foi dia de fantasmas. Queria esconjurá-los junto ao mar. Respirando a maresia. Deixando o vento despentear-me o cabelo. Deixando os teus dedos prender-me o cabelo. Aconchegando-me a ti. E no calor de ambos, dissolver todos os fantasmas negros ou dolorosos, teus e meus. Ficando só nós. Nós e o som e o cheiro das ondas do mar a quebrar-se aos nossos pés.


 
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