Um pouco mais de azul

sábado, abril 16, 2005

Intimismos ao final do dia

O frio regressou. Estou de novo vestida como em casa ando no Inverno, depois de ter enregelado ao ar livre durante toda a tarde. Meias grossas, camisola quente, manta sobre as pernas enquanto escrevo no computador, sensação de que o vento varreu os meus pensamentos horas a fio.
Talvez por isso eles sejam estranhos. Por isso, e por ter aproveitado as brincadeiras infantis a que deitava um olho para ler. Por vezes, quando leio um livro que de facto me interessa, enfio-me nele e de lá não saio - parece que parte de mim fica presa no meio das páginas. Estou assim hoje, meia ausente.
E distante. Olho o que me rodeia como se o visse de cima, de um outro lado qualquer. Meto-me em arrumações, necessárias mas que invocam inevitáveis recordações. Quando comprei certas peças de roupa. Quem mas ofereceu. Quem mas ajudou a escolher e gostava de me ver com elas. Essas vão, quase todas, direitinhas para o saco da roupa para dar. E uma porta mais se fecha cá dentro.
Acho que nos podemos imaginar como um edifício cheio de portas e corredores. Umas portas abrem-se porque outras se fecham. Umas portas fecham-se porque outras se abrem. E o edifício muda com as mudanças que sofre. Torno-me diferente de mim mesma. E no entanto, sou sempre eu. Mais o que a vida me dá.
Peças de roupa. Muitas delas, se eu fosse como hoje, nunca teriam sido minhas. Como muitas atitudes não teriam sido tomadas (ou deixadas de tomar). Se eu fosse então como sou agora, teria decerto poupado boa parte das lambadas que levei. Mas eu não podia ser assim nessa altura. Foi a vida que me modificou, moldou, transformou. Em certa medida, fez-me crescer e desabrochar.


 
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